quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Ano Novo

Decidi escrever sobre o ano novo por algumas razões. Primeiro por observar que 2015 parece ter sido um ano difícil para a maioria. E também por ter percebido tantas pessoas que me parecem estar paralisadas em seus problemas, um tanto perdidas em relação aos próximos passos.

O começar de um ano não é diferente de qualquer amanhã. Apenas um novo dia, um novo amanhecer. Porém um novo dia que carrega consigo um simbolismo universal e a força de milhares de mentes humanas pelo mundo. Logo é sim um momento importante, onde a maior parte das pessoas tem em mente ideias de recomeço, renovação e esperança. Para o inconsciente coletivo é como se pudéssemos colocar um ponto final nos problemas e começar de novo.

É muito importante sabermos aproveitar essa energia de renovação, porém é importante também lembrarmos que nada acontece magicamente, se não mudarmos interiormente, se não compreendermos nossos comportamentos e pensamentos, rever nossas ações, e encontrar a chave para a transformação, nossa vida não ira se tornar magicamente diferente por conta do calendário. Toda mudança precisa ser primeiro interna.

Para promovermos essa mudança interna é preciso lembrar de alguns ensinamentos milenares muito importantes:

1. Nada acontece na sua vida por acaso.
Cada acontecimento carrega consigo um ensinamento precioso e a possibilidade de crescimento interno. Você precisa sair das armadilhas da mente, parar os pensamentos comuns que nos prendem a ideias sociais pré estabelecidas como "Porque isso esta acontecendo comigo?", "porque eu?", "Mas eu sou tão bom", "Mas eu me esforcei tanto", "Nada da certo mesmo", "Nunca vou conseguir"...e por aí vai...
Esses pensamentos apenas nos paralisam e nos impedem de ver a realidade. Nos impedem de compreender a situação como ela é, e entender o que ela significa para você e para sua vida e assim, com clareza, perceber qual a melhor ação a ser tomada em sequência.
Isso nos leva ao próximo ensinamento:

2. Sofrimento é não aceitar o presente.
Todos esses pensamentos que citei acima são uma negação do presente. Uma negação da realidade. Essa negação nos faz entrar literalmente numa dimensão ilusória, onde estamos o tempo todo nos sentindo injustiçados, com raiva do mundo, achando que tem algo errado ou que o mundo nos persegue, entre outros sentimentos e impressões que são criadas pela mente quando entramos nesse discurso mental. E isso nos faz sofrer. É como se estivéssemos presos a um véu de ilusão que nos faz entender toda a realidade de forma deturpada.

Pense por exemplo num dia em que você acorda e logo de manhã algo da errado, e você pensa "Hoje não é meu dia!", esse pensamento já basta para transformar toda a sua realidade. Certamente naquele dia tudo vai dar errado. Mas será que tudo está dando errado mesmo, ou a sua raiva interna está fazendo com que você se irrite com pequenas coisas? E essa raiva e mal humor faz com que você tenha ações diferentes e responda pessoas de forma diferente, o que gera toda uma cadeia de reações. Se você na mesma manhã respirasse fundo, olhasse para o céu e sentisse gratidão por estar vivo e pensasse "Hoje nada vai me incomodar!" será que seu dia não seria totalmente diferente, mesmo diante dos mesmos fatos externos?

É claro que em situações graves vamos sentir dor e tristeza, isso faz parte da vida. Não é para negar isso, pois aí estaríamos entrando em uma outra camada ilusória, fingindo que tudo é lindo. A dor e a tristeza fazem parte da vida, mas o sofrimento não. O Sofrimento está em não aceitar o momento. Em lutar contra ele como se ele não devesse estar acontecendo. Quando você aceita a realidade, você vive plenamente o sentimento que aquela realidade traz de verdade, e não um sentimento exagerado ou deturpado. Vivendo plenamente o sentimento real que um acontecimento te causa, você pode sentir, entender, e no seu próprio tempo planejar com clareza o próximo passo.

Tudo que você está passando está te preparando para tudo o que voce desejou.

3. "Conhece-te a ti mesmo e conheceras o universo".
Sair da ilusão da mente nos faz entrar em contato com quem realmente somos. Você não é a sua mente. Você não é o seu Ego, sua ideia de identidade. Você é mais que isso. Eu poderia usar diversas palavras para explicar quem você é, mas só você pode sentir isso.

Esse eu é totalmente livre das mascaras e amarras sociais e só conhecendo e sentindo ele é que você pode entender o que realmente quer, pois nossa mente está absolutamente poluída por ideias da nossa cultura, da nossa sociedade, dos nossos pais, num nível do qual é impossível escapar. Nos perdemos em tantas exigências externas que chega um momento da vida que não sabemos mais se somos nós mesmos ou apenas um apanhado dessas influências externas.

Por isso é preciso sair da mente, desliga-la por alguns momentos para sentir esse eu real. E quando você sentir você vai saber o que dessa bagunça toda é você e o que não é, e todas as decisões a partir daí se tornam mais fáceis. As duvidas diminuem porque a mente para de pensar tanto e a intuição, o sentir, começa a nos guiar mais.

"Perca a cabeça, ache a alma."

A meditação é uma ferramenta incrível para nos ajudar a acalmar a mente e entrar em contato com nosso eu interno e real. Estar em contato com a natureza também nos promove essa ligação. Alguns tipos de terapias também podem ajudar, (mas não as que ficam apenas focadas na fala, porque isso reforça os padrões mentais ao invés de nos libertar deles). Terapias corporais, Arteterapia, Yoga, são alguns exemplos. Qualquer expressão artística também promove esse contato, a criatividade vem do seu eu interno e não da sua mente.

Uma última dica nesse processo todo é: Se você percebe que tudo está dando errado, que parece que as coisas estão estagnadas apesar dos seus esforços (importante: deve haver esforço real!), você faz, cria soluções, age, mas nada funciona. Você se sente como se estivesse andando numa lama, lenta, se arrastando, tudo é difícil, algo te prende...É porque você não está no seu caminho. Sua vida não está de acordo com a sua essência, com quem você realmente é. O universo nos da sinais, e as vezes nos pressiona para que a gente precise agir e mudar. Quando você está no seu caminho (e não existe certo e errado existe o seu) tudo fluí. Você sente as coisas fluindo naturalmente, mesmo que sua vida não seja um mar de rosas.

Então aproveite a energia de renovação do ano novo para se renovar internamente. Transforme primeiro seus pensamentos, depois a forma como você vê o mundo e por ultimo suas ações. Espero que essas dicas possam ajudar nesse processo.
E que em 2016 sejamos todos mais conscientes e mais comprometidos e amáveis com nós mesmos, uns com os outros e com o universo.



terça-feira, 27 de outubro de 2015

Sobre altos e baixos e a negação da dor

“Não há despertar de consciências sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma.”
“Ninguém se torna iluminado por imaginar figuras de luz, mas sim por tornar consciente a sua escuridão.”  - Carl Gustav Jung

Vivemos numa sociedade que exalta a busca por uma felicidade inexistente e idealizada e nega a dor até o limite do impossível.  Somos todo tempo bombardeados pela ideia de que estar triste ou sentir-se mal com alguma coisa é terrível e deve ser evitado ou transpassado o mais rápido possível, enquanto a realidade é que apenas através da dor e dos momentos difíceis nos transformamos e nos conhecemos mais profundamente. Nesses momentos reside a maior oportunidade de sabedoria e aprofundamento em si mesmo.

“OM MANI PADME HUM” é um mantra budista que significa: “ a flor que brota da adversidade.”  Da lama nasce a flor de lótus, uma das flores mais belas nasce na lama. Esse mantra carrega o simbolismo de que é exatamente nos momentos mais difíceis e doloridos que temos a oportunidade de criar, de dar luz a nossa sabedoria interna. Muitos já escreveram ou falaram sobre isso, mas até hoje esquecemos e cada vez mais a nossa sociedade, voltada para o externo e para as aparências, nega esse saber. 

A explicação psicológica é muito simples, segundo a análise Jungiana, tudo o que nos incomoda, fazemos um esforço enorme pra negar, seja este esforço consciente ou não. Muitas vezes algo nos incomoda tanto que nos convencemos que não temos aquele "algo" (seja uma característica, um comportamento, pensamentos, etc) e a psique gasta energia para reprimir aqueles aspectos e eles permanecem inconscientes. No escuro é onde vivem os “monstrinhos”, e quando não estamos olhando eles fazem a festa, se reproduzem e crescem, sem que a gente sequer saiba disso.

E então algo externo acontece na sua vida (isso também não é por coincidência, mas esse já é assunto para outro post...rs...) e você se vê “obrigado” a olhar para aquela questão que tanto evitou. Você se vê obrigado a lembrar e aceitar que aquilo faz sim parte de você e está sim presente na sua psique. Certamente este é um momento de dor, mas como amadurecer sem olhar pra isso? Como ser você mesmo se estiver sempre evitando ou escondendo um pedaço seu?

"Tire a mascara. Seu rosto é glorioso" - Rumi.


Outra frase budista diz que a dor é inevitável e faz parte da vida, já o sofrimento é uma escolha. Se passarmos a entender a dor e a tristeza como parte do nosso processo de existência e do nosso ser, e uma oportunidade de crescimento e transformação, não vamos sofrer com isso. O sofrimento está na não aceitação de um momento, ficamos nos debatendo contra o momento, como se nadássemos contra a correnteza. Se aceitarmos que aquele é o nosso momento,  podemos entender como viver nele da melhor forma e como usá-lo como uma oportunidade.

A vida sempre será cheia de altos e baixos, nossas emoções são pura energia, não importa se você está dando uma boa gargalhada ou chorando intensamente, é pura energia do seu ser que você está manifestando e ambas são naturais e belas e fazem parte do momento em que você se encontra. Esteja presente no momento, sinta ele e aceite ele por inteiro, assim você vai compreende-lo e saber qual a melhor maneira de vive-lo. 

"A Roda da Fortuna"- Arcano do tarot que simboliza exatamente os "altos e baixos" da vida.

Se olharmos pra natureza, pra vida na sua forma mais pura, veremos claramente o movimento, a instabilidade e o caos.  O confortável muitas vezes não nos ajuda, mas nos anestesia e acaba nos mantendo numa estabilidade que é contrária a vida. 

Sair da sua "zona de conforto" é o primeiro passo para qualquer mudança. E se você não sabe bem o caminho, siga qualquer caminho, pois o que importa não é exatamente onde vamos chegar mas o quanto e como vamos nos transformar durante o percurso. Como disse o sábio gatinho do conto da Alice no Pais das Maravilhas "Se você não sabe pra onde ir, qualquer caminho serve." (Lewis Carroll)

terça-feira, 20 de outubro de 2015

Persephone e o mergulho no inconsciente

Continuando no clima do Ciclo de Palestras no qual estou participando, onde falo sobre os arquétipos das deusas gregas no nosso inconsciente (para entender melhor, leia o post anterior), trago uma analise do mito da Persephone para pensarmos um pouco sobre amadurecimento e a questão da sombra Jungiana.

Um resumo do mito:


Persephone antes de se tornar esposa de Hades e rainha do submundo, era apenas uma menina ingenua e infantil que viva sobre os cuidados de uma mãe super protetora, a deusa Deméter.
Havia um desejo inconsciente de se libertar e amadurecer, porém sob os cuidados da mãezona, Persephone não era capaz nem de perceber esse desejo.

Hades, o deus que comanda o mundo avernal, (que é  o submundo, o mundo dos mortos, na mitologia grega), se apaixona por Persephone e como sabe que Deméter nunca iria permitir essa união ele decide agir por conta própria. Um dia Persephone estava colhendo flores no campo,quando de repente Hades aparece do chão e a sequestra para seu reino. Persephone acaba comendo uma Romã, sem saber que quem comer qualquer coisa no mundo avernal ficara condenado a nunca mais sair de la.

Após muitas ameaças de Deméter e negociações com Zeus, Hades chega a um acordo com todos e Persephone acaba passando metade do ano no mundo avernal com Hades, que se torna seu marido, e metade do ano com Deméter. Nesse processo Persephone se torna a rainha do submundo, e uma das deusas mais poderosas do Olimpo, pois ela é a unica deusa que pode ir e vir do mundo avernal.


O mundo avernal representa o inconsciente, onde todos os "fantasmas" habitam... Nele esta nosso passado, traumas e memorias esquecidas. Como amadurecer sem olhar pra isso?

Este mito fala sobre este processo de transformação e amadurecimento. Persephone era apenas uma menina e depois que entra em contato com o mundo avernal, com seu inconsciente e sua Sombra, ela amadurece, reconhece seu potencial, e se torna uma deusa poderosa.

Jung fala sobre o conceito de Sombra, definindo como um aspecto (ou um conjunto de aspectos) geralmente desconhecido do eu, que negamos em nós. São aspectos inconscientes, virtudes e defeitos, que por determinados motivos (complexos, traumas, etc.) não conseguimos ver conscientemente em nós.

Logo, olhar pra sombra é o momento onde encaramos tudo aquilo que não queremos ser, tudo aquilo que fazemos um esforço imenso para negar que temos presente em nós, mas no fundo sabemos que temos. Negamos porque consideramos "ruim", "errado", "feio" ou qualquer outro conceito que a sociedade nos impõe, ou negamos apenas por não saber lidar com aquilo. Porém a verdade é que só seremos nós mesmos quando nos olharmos por inteiro.


No mito, Persephone não queria olhar para seu poder, pra sua sexualidade, para o seu feminino, e através de Hades ela pode encarar sua sombra. Parece agressivo o rapto, porém isso é apenas uma alegoria muito presente nos mitos antigos. Hades representa aqui o próprio inconsciente de Persephone, seu Animus segundo a teoria Jungiana, e através da integração com ele, e do mergulho no seu inconsciente, ela descobre mais sobre ela mesma e se torna quem ela realmente é.

Este é outro ponto importante do mito, o relacionamento com o outro é um grande espelho e potencial transformador. Você pode amadurecer e se transformar sozinho, muitas vezes, mas é através do outro que você pode aprofundar nas suas questões mais inconscientes, que sozinho não somos capazes de ver. Se estivermos atentos as nossas relações, vamos perceber que elas sempre estão nos mostrando parte de nós. O externo apenas reflete o interno.



Persephone representa o arquétipo de uma mulher muito poderosa, muito intuitiva e ligada as questões do inconsciente. Depois que ela conhece e aprende a lidar com o seu inconsciente (o mundo avernal no mito) ela pode ir e vir com uma facilidade que nenhuma outra deusa tem. Isso representa a capacidade de olhar para a sombra, para o inconsciente e não se perder por la, não ficar "preso" em seu mundo interno, saber voltar para a "realidade" utilizando tudo o que aprendeu. Literalmente, trazer da sombra para a luz. Mulheres que tem esse arquétipo muito forte dentro de si, podem ser otimas terapeutas, tarologas, médiuns, ou tem grande atração por tudo que aborde o inconsciente e o mundo espiritual. Porém se elas tentam ignorar esse aspecto delas, elas podem permanecer imaturas ou perdidas em um mundo de fantasias internas.

***
Gostou?
Saiba mais sobre as deusas que nos habitam no Ciclo de Palestras Sabedoria Natural Feminina e em breve também darei um Workshop vivencial sobre o assunto!
Informções sobre a palestra em "Eventos"
Sobre o Workshop entre em contato: vanessa.cmartins@gmail.com




quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Arquétipos e Deusas

Em breve começarei a participar de um ciclo de palestras sobre o feminino, e eu irei abordar o tema: "As deusas que vivem em você". 
Vou falar sobre os arquétipos das principais deusas gregas e como eles influenciam em nosso inconsciente. Por isso decidi fazer esse post para falar um pouco do conceito de arquétipo e da forma como penso o feminino neste trabalho.



Segundo Carl Gustav Jung os arquétipos são núcleos instintivos, isto é, impressões herdadas naturalmente, que trazem padrões de comportamento humanos. Um exemplo fácil seria o arquétipo materno. Este é um padrão de comportamento humano inato em nosso inconsciente e ele se materializa de diversas formas durante a história da humanidade, através de imagens mitológicas como a de Maria, Deméter ou até mesmo a Madrasta má dos contos de fada.

Existem infinitos arquétipos no inconsciente coletivo que se manifestam em nossa vida através de mitos, contos de fadas e religiões. Todos estão presentes no inconsciente coletivo, porém um ou outro acaba “brilhando” mais forte em nosso inconsciente pessoal, e isso é uma dica de quais complexos estão fortes na nossa psique naquele momento.

Por exemplo, se buscarmos observar o porquê da identificação de uma criança com um conto de fada, perceberemos que as questões presentes naquele conto são semelhantes ao que a criança está vivendo, ou já viveu, como ela internalizou uma experiência e como ela se sente e se comporta diante de alguns aspectos de sua vida. O mesmo serve para adultos! Nesse trabalho vamos buscar através da simbologia dos mitos gregos, acessar esses arquétipos, essas impressões gravadas em nossa psique e observar de que forma elas influenciam nosso comportamento e nossa vida.



O feminino através das deusas:
Com “deusa” nós estamos nos referindo a uma descrição psicológica de um tipo complexo de personalidade feminina que reconhecemos intuitivamente em nós, nas pessoas a nossa volta e também em imagens e ícones da nossa cultura.

A mitologia do feminino sempre foi multifacetada, revelando diversos arquétipos, alguns muitas vezes até contraditórios. Na mitologia as deusas representam as diversas facetas do feminino, como amor, poder, cuidado materno, sabedoria, etc. É como se juntos eles representassem a totalidade feminina.

O que podemos observar é que esses arquétipos das diversas deusas que hoje existem na mitologia, estão presentes na construção de qualquer personalidade. Todos eles estão presentes nas pessoas, pois todos eles em conjunto representam a unidade feminina. Porém, como estão fragmentados, acabamos por desenvolver mais em nossa personalidade determinados aspectos em detrimento de outros.

E é importante ressaltar que esses arquétipos do feminino estão presentes no inconsciente tanto da mulher quanto do homem, pois todos nos temos aspectos femininos e masculinos em nossa psique, Yin e Yang, ou Anima e Animus, segunda a linguagem Jungiana.

Nosso objetivo nesse trabalho é descobrir qual o arquétipo da deusa, isto é, qual aspecto do feminino, está mais desenvolvido e mais atuante em nós, e qual delas nós esquecemos, deixamos de lado, na sombra do nosso ser. 

Quem tiver interesse de participar da palestra todas as informações e inscrições aqui:
http://eventogolden.com.br/artedesi

sábado, 25 de julho de 2015

O Artista

"Uma noite nasceu-lhe na alma o desejo de esculpir a estátua do Prazer que habita um instante e saiu pelo mundo em busca do bronze, porque só podia imaginar sua estátua em bronze.

Mas todo o bronze do mundo tinha desaparecido e em nenhuma parte da terra podia encontrar-se bronze algum, exceto o da estátua da Dor que dura uma vida inteira.

Ora, mas fôra precisamente ele mesmo quem, com suas próprias mãos, havia modelado a estatua  da Dor que dura uma vida inteira, colocando-a no túmulo do único ser a quem amara em sua vida.

Ergueu, pois, no túmulo da criatura já morta a quem tanto amara, aquela estátua, que era criação sua, para que representasse amor do homem que não morreu e um símbolo da dor humana que dura para sempre. E no mundo inteiro não havia outro bronze senão o bronze daquela estátua.

Então tomou a estátua que havia modelado, colocou-a em um grande forno e entregou-a ao fogo.
E com o bronze da estátua da Dor que dura a vida inteira, modelou a estátua do Prazer que habita um instante."

The Artist - Oscar Wilde


A cada instante temos uma escolha. A escolha de permanecer como estamos ou de transformar o que sentimos que já não nos serve mais. Ninguém pode fazer isso pela gente, nem outra pessoa, nem as circunstancias da vida, nem mesmo os acontecimentos inesperados; pois por mais inesperados e conturbados que sejam os fatos, se a transformação não for interna, você continuara lidando e reagindo a eles da mesma maneira. A mudança real ocorre internamente e só acontece quando você escolhe, decide e permite.

E para permitir a mudança é necessário abrir espaço para o novo, desapegando dos antigos padrões de comportamentos e sentimentos, é preciso abrir mão do que você acreditou ser, para se tornar quem você realmente é.
Não se trata de jogar tudo fora, é preciso derreter o bronze da estatua para, a partir de sua base, transforma-la em outra.



Ao transformarmos o interno, o externo se transforma. E não o contrario. Não adianta esperar que a estatua se modifique sozinha magicamente, você a criou e você deve transforma-la em algo novo. Nós somos os alquimistas. Nós criamos nossa realidade.


"A alquimia representa a projeção em laboratório de um drama ao mesmo tempo cósmico e psicológico."
C.G.Jung

quarta-feira, 27 de maio de 2015

O sofrimento é uma escolha

Muitas vezes a gente acha que precisa ficar mal e sofrer por determinada situação ou questão, como se aquilo legitimasse a importância da situação. Como se sofrer validasse o sentimento, numa tentativa de provar pra nós mesmos e pro mundo, o quanto aquele sentimento tem importância. Como se o não sofrer diminuísse a importância do sentimento. Muitas vezes não queremos desapegar do sofrimento, porque ele nos lembra a nossa mente uma situação e uma emoção a qual queremos manter na nossa vida, e assim continuamos sofrendo por apego, pra manter a presença de algo que já passou.

A dor faz parte da vida. Haverão momentos de dor e eles passam por você assim como nuvens passam em frente ao sol. Você é o sol e não as nuvens. Se você se identificar com as nuvens você vai esquecer que é um sol, se você se identificar com a dor, ela se torna sofrimento. Sofrer é uma escolha.
Sofrer é apego e identificação com a emoção. E você não é sua emoção. Você é muito mais do que isso. As emoções são as nuvens, você é o sol.

O sofrimento é uma negação, uma não aceitação, do presente. A mente tem o hábito de fugir do agora, de resistir ao agora. Isso acontece porque o agora é atemporal e a mente não consegue permanecer no controle sem que esteja inserida na ideia de tempo linear. A mente consciente só compreende e controla o tempo linear, passado e futuro. Por isso mentalmente estamos sempre negando o momento presente e apegados as emoções e vivências passadas ou idealizações e projeções do futuro. A verdade é que fazemos isso porque isso nos traz uma falsa sensação de controle, estamos identificados com a nossa mente e acreditamos que assim controlamos nossas vidas. Enquanto na verdade não controlamos nada, a sensação é ilusória, pois tudo que existe de fato é o momento presente.

Se opor ao agora é se opor a vida. É simplesmente deixar de viver.

"Existem apenas dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, então Hoje é o dia certo para amar, acreditar e principalmente viver." Dalai Lama


Logo, a mente nunca vai encontrar a solução para seu sofrimento ou para seus problemas, sejam quais forem, porque ela é em si parte intrínseca do problema. E você não é a sua mente.
Enquanto estivermos identificados com nossas mentes e emoções sempre haverá sofrimento.

Porém essa transformação não é fácil, essa mudança de paradigma é algo profundo, porque essa identificação vem do ego, é uma segurança para ele, a sensação que temos é de que tudo o que vivemos e as emoções que sentimentos constituem quem somos. Formam nossa identidade. Nossa mente e pensamentos também, sentimos que somos eles e abrir mão deles traz uma sensação de despersonalização, como se tivéssemos abrindo mão de nós mesmos. 

Porém, é exatamente o contrário. Se começarmos a observar os nossos pensamentos e emoções como um observador não identificado, como se houvesse um eu que pensa e um eu além do que pensa, começamos assim a nos aproximar do nosso Ser. Jung descreve bem esse processo, o qual denominou "Processo de Individuação" onde o ego deixa de ser o centro da psique e este passa a ser o Self, que seria, simplificando muito em palavras, algo como a nossa verdadeira natureza.

O caminho para chegar a si é interno e solitário. Depende da desconstrução de uma identidade criada pela nossa mente e da transformação da nossa maneira de lidar com as emoções. E antes de tudo, depende principalmente de estar no presente. Só no presente estamos vivos de verdade.

"Todas as coisas realmente importantes como a beleza, o amor, a criatividade, a alegria, a paz interior, surgem de um ponto além da mente. É quando começamos a acordar." 







Fonte: Livro " O Poder do Agora" , Eckhart Tolle

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Desapego e Liberdade

Esse texto é uma reflexão um pouco mais pessoal e menos técnica, porém achei válido compartilhar com vocês.

Ultimamente venho pensando sobre a relação entre desapego e liberdade e como estão diretamente relacionados. Falamos tanto sobre liberdade, sobre como queremos ser livres, mas às vezes acho que é como falar de felicidade, ficamos almejando algo que nem sabemos o que é de fato, e que por não saber, idealizamos. A idealização que fazemos da liberdade, na minha opinião, é algo impossível de se viver.

Tenho percebido que o mais imprescindível para que alguma liberdade seja possível é o desapego. E o desapego é um dos exercícios mais difíceis para o ser humano. Somos acostumados ao apego. Somos apegados a tudo. Desde objetos até pessoas. Nossa sociedade há muitos anos nos acostuma com a ideia de que ter, possuir, é tão importante que sem isso podemos até mesmo morrer. A posse se tornou um instinto de sobrevivência pro ser humano e isso está tão enraizado que quando tentamos nos desapegar de algo todos os nossos mecanismos de defesa ficam em alerta.

Por isso tememos tanto as mudanças, por isso ignoramos a ideia de que a morte existe, porque para entender as mudanças ou a morte como processos de transformação, precisamos primeiro nos desapegar. Para transformar é preciso deixar o velho ir para chegar algo novo, e para isso precisamos nos desapegar do velho, desapegar do que temos ou vivemos nesse momento para dar espaço para novos momentos, novas vivências.



Viver as experiências sem permitir que elas te capturem e te congelem num único estado de ser. Viver as experiências, ser transformado por elas, e continuar vivendo, num fluxo infinito, numa teia infinita de vidas e relações. Não seria isso liberdade?

“Queremos ter certezas e não dúvidas, resultados e não experiências, mas nem mesmo percebemos que as certezas só podem surgir através das dúvidas e os resultados somente através das experiências.” Carl Jung

Sentir as emoções quando elas passam por você, intensamente, como se fosse a coisa mais importante, porque naquele momento é. Viver o momento intensamente como se só existisse ele, porque na verdade, só existe ele. Mas deixar a emoção ir, ela não é você. Deixar o momento ir, ele não te define. E seguir para novos momentos, novas emoções, novos pensamentos e pontos de vista e em meio a tantas transformações encontrar você. Aquele real você, que permanece, e segue se transformando...isso, talvez, seja ser livre.

“A maioria das pessoas não quer realmente a liberdade, pois liberdade envolve responsabilidade, e a maioria das pessoas tem medo de responsabilidade.” Sigmund Freud

Logo não é possível ser livre e apegado ao mesmo tempo. Os apegos te prendem a um estado emocional constante, ou a pessoas, ou a situações e te impedem de transformar. E se te prendem em um único estado e te impedem de transformar, então estão te impedindo de ser você; Somos múltiplos, infinitos e dinâmicos como o universo. A vida nunca é estática. Se é estático não é vivo. A vida dança.

“Mas onde se deve procurar a liberdade é nos sentimentos. Esses é que são a essência viva da alma.” Goethe


terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

"Onde há luz, há sombra"

Essa frase foi escrita por Carl Gustav Jung, sobre o conceito de Sombra, um dos arquétipos da psique humana segundo a Teoria Jungiana. Você já ouviu falar do conceito de Sombra na psicologia analítica?


A Sombra emerge no processo de autoconhecimento, no momento em que o ego começa a se diferenciar da persona (as máscaras sociais), isto é da imagem ideal que tem de si. Sem tanta idealização começamos a fazer contato com um lado mais oculto, aspectos mais inconscientes de nós mesmos, que muitas vezes são os que mais negamos.

A Sombra é um aspecto (ou um conjunto de aspectos) geralmente desconhecido do eu, que negamos em nós e tendemos a projetar nos outros. São aspectos inconscientes, virtudes e defeitos, que por determinados motivos (complexos, traumas, etc.) não conseguimos ver conscientemente em nós.

O outro funciona como um espelho. Só percebemos e nos incomodamos demais com o que de alguma forma temos em nós. O incomodo na verdade é consigo mesmo. Projetamos de maneira inconsciente como uma oportunidade para enxergarmos, pois é mais fácil a princípio enxergar no outro do que em si.

“As coisas que mais repugnamos em nós e que por isso reprimimos, nós a projetamos nos outros, seja ele o vizinho, o nosso inimigo político ou uma figura símbolo como o demônio. E assim permanecemos inconscientes de que as abrigamos dentro de nós.” Nise da Silveira

 “Aquilo com que você não consegue coexistir não o deixará existir.” Bill Spinoza


A sombra é o oposto da consciência, mas também é o que falta a cada personalidade. Falta, pois costumamos negar e reprimir o que nos incomoda em nós, e desta forma não nos vemos por completo. Jung dizia que onde há luz, há sombra, e inclusive, quanto maior a luz, maior a sombra.

Por isso podemos observar num processo de autoconhecimento, onde começamos a “iluminar”, isto é, perceber aspectos desconhecidos de nós mesmos, que surgem em nós qualidades que consideramos positivas e negativas. Esses aspectos surgem simultaneamente e parecem crescer durante o processo. Tanto os considerados positivos quanto os considerados negativos.

A verdade é que essas características não estão crescendo ou aumentando em nós, e nem mesmo estão surgindo, pois sempre estiveram ali. Estamos é percebendo de forma cada vez mais consciente cada uma delas. E o que consideramos positivo ou negativo, muitas vezes vem de uma visão dualista da cultura na qual estamos inseridos.

Se estamos ampliando o olhar sobre o nosso interior, não há como selecionar para onde vamos olhar. Se estamos realmente ampliando este olhar, olharemos para o que nos desagrada também, e esse é o maior desafio e o que traz o maior amadurecimento.

Qualquer característica ou aspecto interno nosso pode fazer bem ou fazer mal, tanto para nós mesmos quanto para outros. Depende do momento e da forma como nós lidamos com aquela característica. Porém, para podermos lidar com a característica precisamos antes ter consciência de que ela existe.

Uma certa escuridão é necessária para ver as estrelas.

Negar a sombra é fornecer a ela mais poder. Quando negamos esses aspectos eles se tornam mais inconscientes e podem vir à tona de maneira incontrolável em momentos de fortes impulsos emocionais. Muitas vezes podemos ter ações as quais não controlamos. Nesses momentos é a sombra atuando de forma autônoma, e isso pode causar mal a nós mesmos e a outros.

Se conhecemos mais profundamente nossos aspectos, e principalmente, aceitamos todos eles, podemos aprender a lidar com aquele aspecto mais difícil, que nos desagrada ou já nos fez mal de alguma forma. Reprimir ou ignorar não fará com que ele desapareça, muito pelo contrário, aquele aspecto contém uma energia que quanto mais contida mais força ganha, como uma mola pressionada em uma caixa, ou um animal selvagem preso durante muito tempo numa jaula.

Precisamos esquecer por um momento a visão dualista da sociedade, que define opostos como certo e errado, bom ou mau; e compreender que o que importa é descobrirmos o que realmente nos faz sentir bem. Lembrando que o que nos faz bem pode não fazer bem ao outro, e o que nos faz bem hoje pode não nos fazer bem amanhã.

Somos perfeitos da forma que somos e todas as características presentes em nós podem ser direcionadas de acordo com a nossa vontade, se estivermos conscientes dela.